Yoandy Leal começou sua trajetória pela seleção neste ano (Foto: Divulgação/FIVB)
Por Sidrônio Henrique, de Brasília (DF)
28 de junho de 2019
A cena tem sido comum na Liga das Nações: Yoandy Leal abre para receber a bola e o levantador arma: entrada, pipe, eventualmente saída. Em seguida, vem um petardo que pode desmantelar o bloqueio, explodir na defesa ou na quadra adversária, sem chance de recuperação. Conter o atacante é tarefa complicada, algo mais acessível numa bola à meia-força, quando não há condições ofensivas ideais. Os erros são raros.
Num dia inspirado, sai de baixo. Foi assim contra a Bulgária, por exemplo, quando o brasileiro derrubou 11 em 13 tentativas, beirando os 85% de aproveitamento no ataque. Não é o tipo de jogador que os oponentes gostam de encarar. Caso alguém ainda se pergunte se ele está adaptado à equipe, é melhor repensar. Aliás, o craque diz que perdeu a conta de quantas vezes respondeu sobre sua adaptação.
O Saque Viagem aproveitou a passagem dele por Brasília, na quinta e última semana* da fase classificatória da Liga das Nações, para um bate-papo.
Embora estreante na seleção brasileira em 2019, o ponta de 30 anos, 2,02m, é um velho conhecido do torcedor. Por seis temporadas, integrou a constelação do Sada Cruzeiro, clube que ajudou a conquistar o tricampeonato mundial, além de vencer quatro vezes o Sul-Americano e a Superliga. No ano passado, foi para o Lube Civitanova, sagrando-se campeão italiano e europeu.
A integração ao time comandado por Renan Dal Zotto é evidente. Após quatro semanas da Liga das Nações, Leal é o único brasileiro no top 10 de maiores pontuadores – leve-se em consideração o fato de o Brasil ter uma distribuição equilibrada, sem concentrar o ataque em nenhum jogador. Em termos de aproveitamento ofensivo, ele é o sexto no geral, com 53,1% – o líder é o oposto iraniano Amir Ghafour, com 57,3%, mas sem a obrigação de passar.
Por falar em recepção, Leal diz que se sente mais à vontade no passe. “Já me sinto mais confortável agora na Liga das Nações. Claro que eu vou continuar trabalhando para melhorar”, comentou.
O atleta cubano naturalizado brasileiro aparece também como o sétimo melhor sacador e está entre os 20 primeiros bloqueadores da competição.
Leal sobre o técnico: “Esse rodízio que o Renan vem fazendo nos permite ter várias formações” (Foto: Divulgação/FIVB)
Yoandy Leal falou conosco sobre as diferenças entre a Superliga e a liga italiana, a dificuldade na recepção, a espera para jogar pela seleção brasileira. Enfatizou a força da equipe treinada por Renan, o papel do Sada Cruzeiro na sua carreira, além de opinar sobre Wilfredo León – cubano de nascimento como ele, mas que ainda este ano vai defender a Polônia.
Confira a entrevista com o camisa 9 do Brasil:
Saque Viagem – Quais as maiores dificuldades que você enfrentou, depois de seis anos jogando no Brasil, ao mudar para a liga italiana?
Leal – A diferença é muito grande… Comparada à Superliga, a liga italiana é mais forte. A maioria dos jogos na Itália têm um nível muito alto. Aqui no Brasil tem quatro, cinco times fortes. Na Itália são praticamente todos, assim você tem que jogar em alto nível o tempo todo, senão você perde.
Saque Viagem – Em que aspectos do jogo sentiu mais diferença? Em quais fundamentos?
Leal – A diferença está em tudo, mas principalmente no saque. Hoje em dia o voleibol se baseia no saque. Na liga italiana, além da potência, ele taticamente é mais trabalhado também.
Saque Viagem – Você teve dificuldade na recepção. Como foi lidar inicialmente com o saque na Itália e como avalia sua participação na linha de passe da seleção brasileira?
Leal – No princípio, eu senti. Quando comecei na Itália, não era acostumado a um saque tão agressivo, mas aí eu passei a trabalhar mais a minha recepção, fui me adaptando, melhorando nesse aspecto. Eu me sinto mais confortável agora na Liga das Nações. Claro que eu vou continuar trabalhando para melhorar.
Leal diz que experiência na liga italiana o fez melhorar na recepção (Foto: Legavolley/Divulgação)
Saque Viagem – Por causa de um erro da Federação Cubana**, você teve que aguardar mais do que o necessário para jogar pelo Brasil. Isso te deixou angustiado?
Leal – Isso não me afetou muito porque eu estava ocupado no Sada Cruzeiro, com tantos treinos, torneios, minha cabeça estava sempre ligada nessas coisas. Eu fiquei muito feliz depois de ter me naturalizado, pois me tornei finalmente um cidadão brasileiro, o que eu já era de coração, e esperei minha hora de jogar pela seleção.
Saque Viagem – Foram seis temporadas no Sada Cruzeiro, sua primeira equipe depois de deixar a seleção cubana. Ao chegar, era reconhecido como grande atacante e sacador, mas obviamente houve uma evolução. O que o clube mineiro acrescentou à sua formação?
Leal – O Sada Cruzeiro me fez amadurecer como atleta, elevou o meu nível. O trabalho do Marcelo Mendez é fantástico, ele foi meu treinador por seis anos. Graças ao clube e a ele, meu nível aumentou muito. Eu sou muito grato a isso. Agradeço sempre ao Sada Cruzeiro por me acolher. Foi uma trajetória muito bonita, cheia de títulos, fui muito feliz ali.
Leal ganhou três títulos Mundiais, quatro Superligas e quatro Sul-Americanos em seis anos de Sada Cruzeiro (Foto: Divulgação/FIVB)
Saque Viagem – Pensa em um dia voltar ao Sada Cruzeiro?
Leal – Eu estou muito feliz na Itália, mas um dia eu gostaria de voltar porque sei que vou ser feliz mais uma vez. Claro que agora meu compromisso é com o clube italiano.
Saque Viagem – Você veio de um país que tem a tradição de revelar atacantes fora de série. De Diego Lapera a Leonel Marshall, passando por Joel Despaigne, entre outros. Algum deles te inspirou?
Leal – No voleibol, eu não tive ídolos. Eu sempre admirei o (americano) Michael Jordan, do basquete, por tudo o que ele fazia em quadra. O Jordan é o meu ídolo.
Saque Viagem – Ao longo dessas quatro semanas de Liga das Nações, vimos você cada vez mais entrosado na seleção. O time tem se soltado aos poucos, o que é natural. Quando avalia o potencial dessa equipe, quais as chances de ouro em Tóquio-2020?
Leal – Nosso time é muito forte e vai melhorando cada vez mais com o entrosamento. Esse rodízio que o Renan vem fazendo vai criando mais possibilidades, nos permite ter várias formações. O grupo está muito bom e deve chegar na Olimpíada com muitas chances de vencer.
Por Cuba, Leal foi vice-campeão do mundo em 2010. Na final, perdeu para o Brasil (Foto: Divulgação/FIVB)
Saque Viagem – Embora ainda falte um ano para os Jogos Olímpicos e muita coisa possa mudar, quais são os principais adversários do Brasil?
Leal – Os Estados Unidos, a França… a Itália, quando tiver todos os jogadores… Tem a Polônia, que já é muito boa e vai ter o (Wilfredo) León, que vai ser uma opção muito forte deles no ataque e no saque.
Saque Viagem – Parte da imprensa europeia aponta o León como o melhor do mundo. Você concorda?
Leal – Isso é coisa deles, não pediram minha opinião (risos).
Saque Viagem – Quem é o melhor do mundo?
Leal – Cada um faz o seu trabalho, eu faço o meu. Não sei quem é o melhor jogador do mundo.
Leal sobre León ser apontado como o melhor jogador do mundo: “Não pediram minha opinião” (Foto: Legavolley/Divulgação)
___________________________________________________
*O Brasil enfrenta, em Brasília, de sexta-feira a domingo, respectivamente, França (às 20h), Canadá (às 20h) e Itália (às 19h), sempre com transmissão do SporTV 2.
**Pelas normas da Federação Internacional de Vôlei (FIVB), se um atleta naturalizado jogou pela seleção do seu país de origem, só poderá ser convocado para uma de outra federação após dois anos. Esse período de 24 meses começa a partir do dia em que a FIVB recebe o formulário de inscrição completo, contendo todos os documentos necessários, de mudança de federação. Após a apresentação da ficha de transferência incompleta em 3 de março de 2016, a Federação Cubana apresentou uma completa em 30 de abril de 2017. Se a primeira ficha estivesse OK, Leal estaria liberado para jogar pela seleção brasileira desde 3 de março de 2018, ou seja, poderia ter disputado o Campeonato Mundial 2018. Mas por causa do erro só foi liberado em 30 de abril de 2019. O ponteiro naturalizou-se brasileiro em 15 de dezembro de 2015. Pela seleção cubana, foi vice-campeão do mundo em 2010, quando sua equipe foi derrotada pelo Brasil na final.